terça-feira, 14 de junho de 2011

Uma perspectiva metafísica

Uma perspectiva metafísica a partir de “Vazio Primordial – Loucura e Desespero de Mãos Dadas no Abismo”

(meu trabalho de aula para a disciplina Estética da graduação em Filosofia da UFSC)

1. COMENTÁRIOS PRELIMINARES

Este trabalho foi realizado seguindo a sugestão do professor Marcos J. Müller-Granzotto de se criar um texto inestético (conceito de Alain Badiou) a partir de uma obra de arte da escolha do aluno. A escolha foi um álbum de música de autoria do próprio aluno e a idéia inicial é a de transformar o álbum em um texto inestético mostrando uma perspectiva metafísica do mundo. Como, de acordo com Badiou, numa análise inestética verificamos os efeitos intrafilosóficos ao acessar uma verdade singular e imanente de uma configuração artística, este texto a seguir irá apresentar uma verdade capturada numa obra de arte e transcrita numa visão metafísica de mundo.



2. INFORMAÇÕES PRELIMINARES


Tipo de obra: Álbum de músicas.
Estilo: darkwave, dark-ambient, industrial, dadá.
Artista: Vazio Primordial (Ismael Ricardo Packer)
Álbum: Desespero e Loucura de Mãos Dadas no Abismo

Descrição do projeto (artista) e álbum:
“Vazio Primordial é a representação da idéia do nada, do abismo, de algo que é pensado como anterior à qualquer existência. Se isto é realmente possível é deixado de lado, desde que a idéia toque a consciência de quem a concebe. O projeto é um filho caótico de Ismael Ricardo Packer.

"Desespero e Loucura de Mãos Dadas no Abismo" é uma pintura de elementos de várias fontes que culminam em caos e falta de sentido. A salvação do indivíduo está apenas no caminhar dele mesmo, o universo é visto como inocente e qualquer outra forma de redenção é ilusão gerada pela dor da vida. O caminhante pode escolher um caminho ou alternar entre vários, algumas idéias são apresentadas nesta pintura e a vontade do companheiro de peregrinação (o ouvinte) é quem determinará suas escolhas.”

Lista das músicas:
1. Ilegítimo Filho do Caos
2. Dispersão
3. A Esmo no Jardim Infinito
4. Viagem
5. Construindo o Templo
6. Passeio em Yesod
7. O Tempo
8. O Sacrifício
9. Esplendor e Glória
10. Passagem

Disponível gratuitamente em:
http://www.archive.org/download/vazioprimordial/vazioprimordial_vbr_mp3.zip
http://www.jamendo.com/en/artist/Vazio_Primordial



3. UMA PERSPECTIVA METAFÍSICA A PARTIR DE “VAZIO PRIMORDIAL – DESESPERO E LOUCURA DE MÃOS DADAS NO ABISMO”

Viemos à existência devido a uma imensidão descomunal de acontecimentos específicos, porém ao mesmo tempo indeterminados, à medida que não partilhamos da onisciência para saber do detalhe infinitamente pequeno e do infinitamente grande. Racionalizamos, intuímos, sentimos, e a partir daí formulamos nossa possível origem; escolhemos um ponto fixo de partida (um Deus ou um acontecimento único), negamos o ponto ou ficamos abertos sem colocar morador nesta residência que é pergunta “qual é nossa origem?”. Criamos as mais variadas teorias, levantamos razões, testamos a natureza, fabricamos supostas verdades e por fim acabamos por deixar essa dúvida inquietante de lado e nos apegamos à coisas que podemos responder facilmente; perguntas sobre coisas corriqueiras, triviais, cotidianas. Assim passamos a viver o cotidiano com esta dúvida voltando ao consciente apenas de tempos em tempos. A angústia que ela causa, porém, sempre permanece de fundo em nossa vida, mostrando o caráter duvidoso de todas as coisas.
A condição do homem é a de viver apenas um momento único, o presente. Em vão indaga sobre o passado e o futuro, ambas suposições teóricas sem cuidado tomadas como realidades concretas; encontra significado, mas não atinge a verdade, algo que lhe é impenetrável mas poucas vezes ele tem consciência disso, por estar adotando suposições ilusórias e agradáveis como verdades. Consegue, incrivelmente, trabalhar com essas realidades ilusórias, porém sempre acaba se dando conta que no fundo o que ele tem é apenas um brinquedo formado a partir de escolhas arbitrárias.
Todo homem e toda mulher, com suas características, preferências, gostos, constituição, inclinações e todas as demais peculiaridades e idiossincrasias, tem em seu âmago algo que é comparável a um buraco negro no interior das galáxias, um insondável mistério que suga tudo para seu centro. Este buraco negro é a pergunta primordial; um sentimento pulsante, nostálgico e esmagador de dúvida da origem. Diversas tentativas foram feitas para apaziguar esta angústia, enquadradas em uma destas classes: ciência, religião, filosofia, arte e misticismo; cada qual com diversas variedades e especificidades. Obtiveram-se respostas, mas nenhuma delas pode ser usada como fundamento seguro de nossas crenças, nem as mais generalizadas, como quando usamos a rigorosa disciplina chamada lógica. Ao falarmos, por exemplo, que existe uma determinada variável “a” tal que qualquer que seja a outra variável “b”, esta outra variável “b” está contida na primeira “a”, só falamos de algo que parece óbvio, a saber, que existe um objeto tal que qualquer outro objeto está contido nele. E o que é este algo que tudo o mais existe nele? Não há uma resposta final, segura, apenas tentativas que são tomadas para teorizar e montar um artifício lúdico. Pode-se tentar responder por Deus (a resposta que parece óbvia, mas não é), por universo, por conglomerados de universos. Isto é o olhar de um ser transparente na direção de um espelho com outro espelho em paralelo, uma visão do infinito circular.
Como promessa da salvação do indivíduo surge uma alternativa dentre uma infinidade em potencial e uma variedade gigantesca em ato. O que pode solucionar este mistério é dado na forma de caminho livre, mas com responsabilidade. Certas coordenadas gerais são dadas e o resto é responsabilidade do caminhante. Este último brilho de esperança do homem, depois de ver tudo cair, é apresentado em forma de mito, visto que nem a rigorosa lógica chegou sequer perto de alguma solução e há algo de asas na imaginação. O mito surge dos estados de consciência evocados de uma singular obra de arte, chamada “Desespero e Loucura de Mãos Dadas no Abismo”, confeccionada pelo artista denominado “Vazio Primordial”.

(o mito)
O homem não tem sozinho a solução do buraco negro, ele é um ilegítimo filho, não reconhecido pelo misterioso pai por lhe faltar a travessia de algo que conhecerá como abismo.
A jornada para justar-se ao pai, origem de sua existência, começa pelo mais banal; seus instintos. Num adestramento, primeiramente dos instintos, depois da emoção, imaginação e razão, galopa em direção a um guardião, sua primeira conquista para o retorno e que o guiará até a beira do abismo, para enfrentar uma grandiosa tarefa. De frente para o abismo depara-se com o seu maior inimigo, a dispersão, que lhe aparece de variadas formas, nunca adivinháveis ou reconhecíveis de longe. Este inimigo, dispersão, é chamado pelo nome Choronzon (koronzon), e deve ser vencido para passar pelo abismo. Uma ponte é criada para a travessia, e aos últimos passos, as estrelas já estão à vista, prontas para a recepção.
O maior prêmio, ao voltar para a loucura de Caos, é fundir-se a ele. Partilhando das criações infinitas, num jardim sem fim de puro deleite, livre dos tormentos instintivos, das crises emocionais, dos paradoxos da razão e contemplando todos os dejetos consumidos no abismo, coroado por ter vencido.
Há um sacrifício a ser feito, na passagem, uma casca deve ser oferecida para poder pisar no que há além do abismo. O filho, que deve estar treinado no passeio consciente em sonhos, num local chamado Yesod e com um veículo a ser construído denominado Templo, obtém esplendor e glória em dois momentos. Primeiramente ao conhecer o guardião que o levará adiante, e depois na triunfante chegada ao seu pai Caos.
No vai e vem eterno, o que atingir o topo uma vez atingirá para sempre, eis a inspiração para o caminhante. O tempo, familiarmente conhecido por sua beleza circular, portanto infinita, é a coroa desta jornada de auto-conhecimento, descoberta e retorno à origem.
(fim)

A promessa só pode revelar-se verdadeira para o individuo caso ele mesmo percorra o caminho, passando por estados de consciência que lhe revelem os detalhes minuciosos, as manobras necessárias, a disciplina e a vontade exigidas. Todo o texto pode até chegar a carecer de significado caso o leitor, aspirante da verdade (e galáxia sendo engolida por um buraco negro), deixe de vivenciar esta que é sua última (por ser única) alternativa.
Para um esclarecimento e breve amostra de justificação, basta lembrar que linguagem é uma coisa diferente de sentimento, e a dúvida que permanece pulsando no âmago do homem não é apenas um conjunto de palavras significantes, e sim uma vontade de retorno que precisa ser compreendida e trabalhada. Nenhum texto sagrado ou filosófico pôde ou pode dar cabo disto. Se o indivíduo não compreender por si mesmo o que é necessário ser feito, nada o poderá salvar. Eis a demonstração da necessidade de se ouvir e deixar levar pela iluminação dos estados alterados de consciência evocados.

7 comentários:

  1. 93.
    Tenho duvidas em alguns pontos:
    1:o abismo que você se refere é obviamente DAATH, mas não entendo essa afirmação que o abismo é o vazio. Podes me esclarecer?
    2:a travessia do abismo não liga religaria o adepto ao “pai”? mas como isso é possível se a existência como conhecemos demanda da Dualidade da tríade e thiphareth? Não seria essa tríade o “pai, demiurgo, etc” ?
    3:não entendi sua ligação de Yesod com a contrução do templo; poderia me explicar?
    Grato desde já!

    Fr. S.
    93,93/93

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  2. 93!
    Primeiramente, para esclarecer, este trabalho tem cunho acadêmico (no sentido de ter sido realizado como trabalho de aula em uma disciplina de minha graduação) mas não tem objetivo de ser uma representação fiel de mitos thelêmicos.
    Agora, diretamente para suas perguntas:
    1 - O Vazio Primordial do nome do projeto denota algo diferente do abismo DAATH, ele é para ser pensado mais como o abismo anterior à criação da bíblia ou o estágio inicial anterior ao big bang, ou qualquer outra coisa nesse sentido.
    2 - Não tenho conhecimento suficiente da cabala para responder plenamente a questão da maneira que você colocou e a interpretação que fiz foi mais livre, para se ajustar à proposta de trabalho feita pelo professor Marcos da disciplina Estética.
    3 - O que eu quis dizer era constituir, construir, formar, treinar o corpo astral (também de uma forma mais livre, para se adaptar à proposta).
    Se quiseres perguntar algo diretamente meu email é don_poseidon@hotmail.com
    93,93/93

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  3. 93.
    Trabalhos acadêmicos tem pelo menos coerência com fatos, ideias, etc. Sejam elas de qualquer natureza ou assunto. É muito fácil jogar ideias desordenadas com base em achismos sobre as coisas. Qabalah e Thelema são coisas distintas, uma é um sistema para a compreensão do universo e outra é uma consecução magicka e mística muito particular.
    Dar mesma relevância do big bang com a criação da bíblia chega a ser engraçado.
    Essas livres interpretações são erros grotescos que a humanidade comete desde seu inicio, interpretar livremente sem embasamento algum e dar ao leitor um texto que pode ser creditado como verdade, quando se escreve automaticamente você cria responsabilidade com pelo menos responder o leitor corretamente. Fica a dica.

    Boa sorte em seus estudos.

    Fr. S.
    93,93/93

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  4. 93!
    Interpretações no fundo são sempre pessoais. Manter-se sempre na convenção é cegueira. Não há outra maneira pra se entender o mundo além da pessoal. Pode-se mudar a própria perspectiva abrindo portas, mas ainda assim só se interpreta tudo a partir de si mesmo. É mais corajoso pensar por si do que seguir o rebanho, qualquer que seja ele. Se não ficou claro o texto, ou confuso, pode ser que seja um erro meu, ou talvez teu, sem outro parâmetro não há como decidir. Não vejo problema no texto sendo apresentado como trabalho inestético, apesar das semelhanças o texto não pretendeu ser uma apresentação autêntica de Qabalah. Se assim o fosse não caberia no escopo deste trabalho. Não entendo porque ficaste nervoso com o meu trabalho, se puder, me esclareça. Pensarei mais no que você me disse. Um abraço.
    93,93/93

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  5. 93. Lei novamente o que escrevi. Não fiquei nervoso não há motivos tal diante de um texto que não me diz nada. 93,93/93

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  6. 93!
    Se não diz nada não há o que falar sobre.
    93,93/93

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  7. Fr. S? Gostaria de continuar a conversar?

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